Transforme-se em sua prioridade

Transforme-se em sua prioridade

Há alguns meses, eu me encontrava internada, em situação gravíssima, isolada em um quarto: meditando, mantendo o pensamento positivo e me perguntando "como eu vim parar aqui?". Por ironia do destino, levando o distanciamento social e medidas de segurança contra Covid-19 com imensa responsabilidade, fui infectada por um vírus respiratório – que não o Sars-Cov2. Minha filha, que é asmática, ficou internada com broncoespasmo e, em poucos dias, estava recuperada. Já o meu caso, evoluiu para pneumonia, que evoluiu para septicemia (infecção generalizada) e eu tive muita sorte de me recuperar plenamente e, agora, estar compartilhando minha história.

Todo este processo me trouxe grande reflexão, um momento intenso e propício para reavaliar, reconstruir e transformar. E algo realmente não saía da minha cabeça: a importância do autocuidado. Com o isolamento social, acabamos absorvendo mais funções da rotina de nossa vida pessoal e familiar. O fechamento das escolas, a interrupção de nossa rede de apoio, a impossibilidade de contato com alguns prestadores de serviço corriqueiros do dia a dia e a adaptação à nova dinâmica no trabalho nos apresentou uma rotina ainda mais pesada, que nos sequestrou qualquer momento de possível pausa, de olhar para nós mesmas.

O autocuidado, tão fundamental para manutenção de nossa saúde física e emocional, não teve espaço durante os meses de isolamento. Se equilibrar a vida de mãe e chefe de família com vida executiva já era um árduo desafio, desde março de 2020, tornou-se algo quase inviável.

Mas além do espectro do autocuidado individual, é importante ressaltar o aspecto coletivo da mulher e seu papel na sociedade. Em 1949, na obra Le Deuxième Sexe? a filósofa existencialista Simone de Beauvoir afirma "Ninguém nasce mulher, torna-se mulher". Em uma sociedade em que as mulheres ganham cerca de 20% a menos que os homens no país, em todas as ocupações, mesmo com mais anos de estudo e tendo a maior porcentagem de diplomas de ensino superior; em que a maternidade compulsória e a falta de divisão de responsabilização e carga mental é romantizada e as mulheres sobrecarregadas e multitarefas são vistas como "guerreiras", é fácil nos desconectarmos de nossas necessidades e perdermos a visão de quem somos, de nossas prioridades e de nossa individualidade.

Em nosso contexto pandêmico, as desigualdades para com a mulher ficam ainda mais exacerbadas: temos a menor participação no mercado de trabalho das últimas três décadas. Isoladas em casa, com escolas fechadas e sem rede de apoio, a responsabilidade pelo cuidado passou quase que integralmente para as mulheres. Vale ressaltar que, estima-se que a economia do cuidado – quase invisibilizada, representaria até 11% do PIB Nacional, em termos financeiros de horas de dedicação. O ambiente de trabalho e ocupação reconhecida e remunerada, além da emancipação, do poder financeiro, também se transformou em um lugar de realização e desenvolvimento das potencialidades femininas.

Os valores de nossa sociedade, a pressão de fazer mais para ter reconhecimento, de necessitar sempre almejar a perfeição, somado ao cenário da pandemia está produzindo um ambiente ainda mais abusivo para nós mulheres. Estamos adoecidas.

No contexto de nossas vidas executivas, falamos muito de transformação, de criar pequenas revoluções nos ambientes de negócios para potencializar os resultados. E, depois de todo susto que passei, foi o que eu fiz: criei um plano de transformação. Passei a me olhar e a identificar pequenas situações que poderiam me auxiliar. O primeiro passo foi resgatar um hobby e, o segundo, utilizar ferramentas de gestão do tempo para ter pausas no trabalho. A gente acha que não, mas fica tudo bem sugerir outro horário de reunião porque aquele que chegou o convite da reunião é bem durante seu "Focus Time". Baixei aplicativos que me ajudavam a lembrar de beber água, alimentar-me bem e até ouvir música nos momentos de leitura de e-mail. Aproveitei e convoquei a "tribo" para compartilhar responsabilidades e a carga mental. Passei a cuidar de mim com a mesma responsabilidade e "perfeição" que eu cuido das minhas entregas e projetos, da mesma forma que eu cuido da minha família e da minha carreira.

Para mim, deu certo! Estou mais leve, feliz, saudável e – acredite! – com muito mais tempo disponível na agenda. Tempo que eu invisto na pessoa mais importante do mundo: eu mesma. Não espere algo quase trágico acontecer com você para mudar de rota. Transforme-se em sua prioridade!     


Claudia Rheinfranck

Claudia Rheinfranck

Claudia Rheinfranck tem 18 anos de experiência profissional, tendo atuado na liderança de processos de transformação, inovação e crescimento de negócios digitais. Tem formação em gestão estratégica pela HBS. É mãe da Nina de 3a 8m, feminista de nascença e uma grande empoderadora de mulheres.


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