Cresci vendo nas fábulas infantis dos anos 80 que madrastas eram bruxas más que escravizavam seus enteados. Que eram incapazes de sentir afeto e bons sentimentos.
Quando eu fazia uma analogia da ficção com meu mundo real, pensava: sou uma criança sortuda e os desenhos da Disney não me representam.
Filha de Pais separados desde os 5 anos, aprendi muito cedo que eles eram mais felizes separados do que como marido e mulher, e consequentemente, eu e meu irmão também.
Quando eu tinha uns 8 anos fui agraciada com uma madrasta de comportamentos opostos do que as mídias, as famílias e as religiões pregavam. Ela era linda por dentro e por fora.
Dócil. Gentil. Acolhedora. Carinhosa. E ainda fazia, genuinamente, questão da minha presença. Não só com ela, mas especialmente com meu Pai.
Certamente, uma mulher sábia que entendia a necessidade da criança e jamais quis disputar a atenção, tempo e o amor nos meus momentos com ele.
Eu adorava nossos fins de semanas, férias em Angra e datas comemorativas. Se ela soubesse o bem que me fez! O quanto me ajudou a entender a decisão e as escolhas dos meus Pais.
Eu a admirava como mulher empoderada, independente e segura de si. E ainda fazia lindos trabalhos manuais de pintura. “Guardo há mais de 30 anos uma caixa de madeira pintada a mão por ela e com meu nome pintado pelo meu Pai”. Não os tenho mais fisicamente, então, acho que ficou como um elo e uma lembrança de uma memória afetiva bem especial.
Hoje, reconheço o quanto ela contribuiu na minha versão feminina. No olhar empático para as outras mulheres e fraternal para as crianças.
Ainda pequena, tentei retribuí todo bem que ela me fez nomeando minha boneca preferida como Verônica em homenagem à ela. E hoje, escrevendo esse artigo.
Outros Papeis importantes nesse contexto:
Da Mãe: Insubstituível! Meu maior amor. Nunca disputou posições. Muito amorosa e sabia da sua relevância para mim. A forma sensível como conduziu tudo fez toda diferença na minha infância.
Uma mulher virtuosa que reconhecia a importância dessa outra mulher na minha formação. Elas se admiravam e se respeitavam. Achava elas o máximo da diplomacia e educação.
Já adulta, perguntei à minha Mãe se o fato de eu ficar em casa brincando e enaltecendo uma boneca com o nome da minha madrasta a incomodou em algum momento.
Ela me respondeu: “Filha, nesse dia eu fiquei em paz! Tive a certeza absoluta que os momentos que vocês passavam juntas eram felizes”. Quanta evolução espiritual tiveram essas duas mulheres da minha vida.
Do Pai: Não passar para a nova esposa a responsabilidade de criar. Sua função continua sendo de Pai. Ela, torna-se sim, mais uma referência na vida da criança, e por isso, a importância da boa escolha.
É dever do Pai (também da mãe) cumprir com suas obrigações não só financeiras mas afetivas, estando próximo quando precisar, dando amor e priorizando a relação com o filho.
A harmonia desses personagens influenciam diretamente na forma como as crianças vão encarar a separação dos Pais e a construção de uma nova família. Hoje, mesmo sendo comum esses modelos familiares ainda presenciamos muitos conflitos. Adultos que não conseguem lidar com as novas emoções que evolvem esse contexto. Padrastos e Madrastas abusando emocionalmente, e as vezes, até sexualmente das crianças. Pais e Mães tolerando isso e ainda fazendo alienação parental. Muitas vezes por ciúmes ou vingança ignorando o quando isso é prejudicial na formação psíquica das crianças.
Certamente, se tornarão adultos com dores emocionais. E bem provável, que inconscientemente, irão transferir certos traumas para seus filhos e netos construindo novas gerações doentes emocionalmente, com dificuldades de dar e receber afeto e de construírem relações saudáveis. Isso é um ponto de alerta que a sociedade precisa observar e amadurecer considerando a diversidade das famílias.
Meu desejo com esse artigo?
Conscientizar Pais, Mães, Madrastas e Padrastos das suas importâncias. Como adultos é de sua responsabilidade tornar saudável a convivência mesmo que os filhos resistam em um 1º momento.
Se algo os bloqueiam nesse sentido façam um trabalho de autoconhecimento. Analisem suas emoções porque é provável que não consigam criar esse afeto por conta de alguma ferida na própria infância.
Talvez, esteja lá esse conflito em não conseguir dar o que não recebeu. Se constatado isso, pegue criança interior “no colo”. Acolha-a. Se empodere do adulto que se tornou e a alimente-a de coisas boas.
Não é porque não nos deram algo na nossa infância que não podemos criar e compartilhar. Faça a ruptura desse ciclo, que provavelmente, foi alimentado pelos nossos ancestrais e pela cultura vivida por eles.
Falamos tanto em deixarmos um mundo melhor para as próximas gerações. As crianças precisam de educação, afeto e bons alimentos emocionais para serem os adultos saudáveis e civilizados do futuro.
Há 20 anos atuando no mercado segurador com experiência em 3 grandes seguradoras nacionais e multinacionais com foco na área de grandes riscos. Graduação e Licenciatura em Ciências Contábeis. MBA Gestão de Negócios e Seguros – IBMEC. Especialização em negócios pela FIA/SP. Formação técnica em seguros patrimoniais e resseguros pela FUNESEG. Coautora da 1ª edição do livro Mulheres no Seguros.