Adoção: a gestação do coração

Adoção: a gestação do coração

Dia 25 de maio é o dia nacional da adoção. Segundo os dados do Conselho Nacional de Justiça, órgão que trata o tema no país, o cenário brasileiro é o seguinte, enquanto escrevo este artigo: 4.385 crianças e adolescentes disponíveis para adoção e 33.971 pretendentes.

Agora você deve estar se perguntando: por que essa conta não fecha? Em entrevista à CNN, o juiz da 4ª Vara da infância e Juventude da Cidade do Rio de Janeiro, Sérgio Ribeiro de Souza, respondeu:  

“Os pretendentes trazem aquela criança idealizada, é normal, natural. Mas cada vez mais o movimento é mostrar a criança real. A partir de oito anos de idade, já começa a ficar mais difícil da criança ser adotada. Quanto mais a idade avança, mais fica difícil. Também grupos de irmãos, crianças com problemas de saúde. São o que a gente chama de adoções necessárias.”

A bem verdade, idealização de filhos não é privilégio dos pretendentes à adoção, mas sim à parentalidade. Convivo com amigos que são pais biológicos e muitos já me relataram isso. Além disso, alguns passaram pela romantização sobre o amor imediato que sentiram ou esperavam sentir pelos seus filhos ao primeiro olhar.

Recentemente, em um evento sobre maternidade e trabalho, a palestrante, mãe biológica, falou que com ela não foi instantâneo. E foi naquele dia que pedi a palavra e contei a minha história de gestação do coração. Naquele momento percebi o quanto o processo de adoção havia me preparado para não passar ou pelo menos minimizar essas expectativas.  

Toda a maternidade é única. Agora eu vou compartilhar com vocês um pouquinho da minha. A minha família não começa saindo de um hospital da moda no Rio de Janeiro com visita da família olhando um bebê pelo vidro. Eu não fui pega pela maternidade compulsória e a pessoa com quem eu me casei também não tinha em si essa exigência de continuidade pelo sangue. Respeito plenamente quem teve essa decisão. Cada um deve buscar suas realizações, seus sonhos. Desde muito jovem eu simplesmente não me via com uma barriga, com um bebê pequeno e com a espera de 9 meses.

Eu acabei esperando muito mais. Foram ao todo 4 anos até sairmos de um abrigo com a nossa filha de 10 anos de idade. Há muita curiosidade em torno do processo de adoção. Por isso, a minha proposta aqui é desfazer alguns mitos que muitas vezes me perguntam. Aqui vão eles:

Você não escolhe a criança. Não basta sair visitando um monte de abrigo e simplesmente escolher uma criança, não é assim que funciona. Primeiro você tem que ir à Vara da infância da Juventude levar uma série de documentos atestados, inclusive médicos e certidões. Ainda nesta etapa do processo, você preenche uma ficha com as principais característica da criança ou adolescente pretendida. Eu não vou dizer que é confortável assinalar se você deseja uma menina ou menino, de que cor ou raça, até que idade, com ou sem irmãos. Confesso que adiamos um pouco para preenchê-la.  

Depois de ter toda a sua documentação analisada e aprovada, você realiza um curso obrigatório para entender como que efetivamente o processo acontece. Nesse momento você sabe que não pode e não deve devolver o seu filho, como pais biológicos também não o fazem, na maioria das vezes.

Então, vem entrevistas com assistentes sociais e psicólogas. Se houver mais de um pretendente as entrevistas são individuais e depois juntas. Eu digo mais de um pretendente porque uma pessoa solteira pode sim adotar uma criança. Há também a visita domiciliar onde a assistente social avalia o ambiente, conversa com as pessoas que convivem ou vão conviver mais com a criança ou adolescente e elabora um relatório sobre a futura família.  

Ufa! E recebemos um documento chamado habilitação. Isso mesmo, passamos a ser habilitados a “pilotar” criança. Após esse processo restou-nos esperar. Durante essa espera grupos de apoio à adoção são fundamentais. Eles aquecem o nosso coração com a experiência de quem já passou por isso tudo, reduzindo bastante a ansiedade e nos ensinando que o amor ele cresce com o tempo, amadurece, se reconhece. Aprendi também que há comportamentos específicos em crianças que foram adotadas e como podemos identificá-los e superá-los juntos. 


Valeria Chaves

Valeria Chaves

Executiva, professora, palestrante e mãe. Diretora de Administração e Tecnologia da Informação, atua há 30 anos no mercado de seguros. Estatística com MBA em Gestão de Negócios e MBA em Gerenciamento de Riscos, tem forte atuação em transformações organizacionais com foco no fator humano. Em 2019 foi finalista do Prêmio Profissional de Gestão de Mudanças pelo Human Change Management Institute.


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